A Era do Swing Jazz
No período conhecido como Swing Era, o jazz ganhou status de música pop e alcançou todo o território norte-americano
O jazz jamais conquistou tamanha popularidade quanto na época do Swing. Entre 1935 e 1946, o estilo ganhou status de música pop e alcançou todo o país com as big bands e o ritmo dançante das composições.
Mesmo já sendo possível escutar as primeiras big bands na década de 20, é com a apresentação da big band de Benny Goodman na Palomar Ballroom — em Los Angeles, 21 de agosto de 1935 — , que a Era do Swing foi iniciada. “Era um público que dançava. É por isso que eles gostavam”, teria dito Benny ao tentar explicar a razão do sucesso.
Segundo o historiador Eric Hobsbawm, antes da década de 1920, “as inovações instrumentais e orquestrais, e o próprio swing, estavam ainda muito pouco elaborados, e depois disso veio a Depressão”, que praticamente exilou o jazz autêntico dos EUA. Foi somente a partir de 1930 que o país foi reconquistado pelo jazz, com o crescimento do Swing. “Na verdade, a música pop adotou, quase que totalmente, as técnicas e os arranjos instrumentais elaborados pelos músicos negros e, especialmente, pelas big bands negras, nos anos 1920. (…) O apelo do swing alcançava quase que exclusivamente os adolescentes”.
“O estilo Swing surgiu do encontro do estilo Chicago com os músicos de Nova Orleans, os quais, nessa época, empreenderam o segundo êxodo da história do jazz — de Chicago para Nova York.”
Duas características marcantes desse período foram o desenvolvimento dos riffs (frases marcantes tocadas repetidamente), presentes principalmente nos arranjos de Count Basie, e o surgimento massivo de grandes solistas.
Para Berendt e Huesmann, as formações de big bands anteriores restringiam a espontaneidade e a criatividade dos solistas, ao passo que permaneciam presos à execução melódica. “Parece contraditório (mas não é) que, em meio a esse processo de formação da big band nos anos 1930, também o solista cresça em importância e significado. O jazz sempre foi simultaneamente coletivo e individual”.
O clarinetista Benny Goodman é considerado o rei da Era do Swing, mas o período também possuía um duque, um conde, um presidente e sua dama. As próximas linhas são destinadas a falar desses grandes nomes, não só do Swing, mas de toda história do jazz.
O Rei
Nascido em Chicago, Benny Goodman começou a tocar clarinete aos 10 anos de idade. Aos 16, já estava tocando na banda do baterista Ben Pollack e, aos 20, foi para Nova York ser músico freelancer.
Em 1934, já com ampla experiência, agarrou a grande oportunidade de organizar a sua primeira banda de jazz para tocar no restaurante-teatro Music Hall. Depois, Benny ouviu que a NBC estava à procura de três bandas para tocar nas noites de sábado em um programa chamado Let’s Dance (Vamos Dançar). Não confiante o suficiente em sua banda, Benny chama o baterista Gene Krupa e Fletcher Henderson para escrever os arranjos.
O Let’s Dance atravessou o país, alcançando toda costa oeste norte-americana. Na noite de 21 de agosto de 1953, em Los Angeles, o Palomar Ballroom foi tomado por jovens, que não conseguiram nem dançar, tamanha lotação do salão. O sucesso foi tão grande, que a banda de Benny ficou durante dois meses tocando no Palomar Ballroom. Quando voltaram para o leste, em Nova York, já estavam famosos.
Outro marco na história do jazz ocorreu em 1938. A banda de Benny Goodman, juntamente com músicos de Count Basie e Duke Ellington, foi a primeira banda de jazz a tocar no prestigioso Carnegie Hall, casa da New York Philharmonic e palco de estreia dos grandes artistas da época. A apresentação é lembrada também por ser a primeira banda formada por brancos e negros a tocar no Carnegie Hall. A respeito disso, Benny teria dito: “estou vendendo música, não preconceito”.
O título de rei do Swing teria vindo de seu baterista Gene Krupa e posteriormente usado pela revista Time, ao se referir a Benny, em 1937. Benny Goodman morreu em junho de 1986, vítima de um ataque cardíaco.
O Duque
Duke Elligton certamente é um dos maiores nomes do jazz. Para Hobsbawn, a ascensão das grandes orquestras de jazz ocasionaram um triplo problema que as big bands teriam de enfrentar: a composição de repertório, a orquestração e os estilos instrumentais; Elligton foi único a resolvê-los e ir além dos desafios. “Foi o talento mais importante produzido pelo jazz até hoje”, diz Hobsbawn, “está, com relação ao seus concorrentes, em uma posição análoga à de Shakespeare em relação ao resto dos dramaturgos elizabetianos“.
No tempo em que a rotatividade de músicos dentro de uma banda era algo cotidiano, a big band de Elligton permaneceu praticamente intacta com apenas sete alterações durante 30 anos. Talvez isso se deva ao carácter pessoal que Duke buscava em cada um de seus músicos ao compor um arranjo. “Você escreve para as capacidades e disposições naturais de cada um e abre um lugar para que cada um possa dar o seu melhor. Minha banda é meu instrumento”, dizia ele.
Para Berendt e Huesmann, “uma das melhores qualidades de Elligton era a forma com que ele transmitia aos músicos suas ideias, deixando em cada um a impressão de ser, como compositor, apenas um meio para o desenvolvimento daquilo que era inato e latente em cada músico. Certamente, o que se ouve é a música de Elligton, mas, com ela, a música de cada um dos integrantes do conjunto”.
Duke foi um inovador. Antecipou estilos e técnicas, e influenciou tudo que veio depois. Mesmo em 1921 ele já compunha It Don’t Mean a Thing If It Ain’t Got That Swing, introduzindo o termo que definiria o estilo dominante a partir 1935.
“Se você realmente quer tocar Duke Elligton, então você também precisa perceber o quão flexível e aberto ele era. Pois você não pode soar como uma big band de universidade lendo as partituras de Elligton. Isso só faz de Elligton um músico ainda mais misterioso. Ele sempre soube encontrar um caminho para transformar o velho em novidade”, disse o pianista Uri Caine.
O Conde
Count Basie é outro que, assim como Duke, é mais importante por seu feito orquestral do que como solista. Uma das marcas de Basie é o uso dos riffs, fórmula do blues oriunda do Kansas. O riff consiste em “pequenas frases que são repetidas como tema ou como elemento de intensificação expressiva e empregadas para a criação de contraste”.
Muitas vezes Basie utilizava os riffs em uma estrutura de pergunta-resposta entre os naipes da orquestra de jazz (naipe é o conjunto de um mesmo instrumento dentro da banda — naipe dos saxofones, por exemplo). Essa estrutura de riffs dava ao solista um papel importante, pois o improviso ocorria entre as execuções do tema (riff). “Muitas vezes, esses riffs surgiam espontaneamente nas orquestras e jam sessions de Kansas City para “incendiar” o solista”, diz Berendt e Huesmann.
O Presidente e sua dama
Um dos solistas de destaque na banda de Basie foi Lester Young, ou “Pres Lester Young”, o presidente, como gostavam de chamá-lo. Lester foi um dos principais sax-tenoristas da história do jazz e, para muitos, introduziu o jazz moderno.
Lester gostava de ouvir discos de cantores para gravar as letras das canções e reproduzi-las através de seus solos. Para ele, “o som é uma janela para alma. Com seu solo você libera seus pensamentos e afetos. Todo solo precisa contar uma história e a história precisa ser verdadeira, relatando todos os afetos daquele momento. Se não for a sua própria história, então esqueça”.
Sobre Lester, o baterista Jo Jones teria dito: “Ele podia soletrar as palavras em seu instrumento. Era sua forma de falar. Em 85% dos casos, eu conseguia descrever o que ele dizia. Eu seria capaz de anotar suas ideias num papel só ouvindo ele tocar. Benny Goodman até fez uma música com base numa frase tocada por Lester: ‘Preciso de grana’ ”.
Essa característica de Lester o aproximou de Billie Holiday, a cantora de jazz considerada como a maior de todos os tempos por quase a unanimidade das opiniões. Foi Lester que lhe deu o apelido de Lady Day.
Essa parceria rendeu e tornou-se referência de acompanhamento solo instrumental de jazz vocal. “Eles se comportavam como se lessem os pensamentos um do outro, como se um sentisse o que outro sentia. Saxofone e voz se tornavam um”, conta Berendt e Huesmann.
Lester também foi uma daquelas figuras únicas do jazz. Dizem que, na orquestra de Basie, ‘Pres’ levava um sino para os ensaios. Caso algum novato errasse, Lester tirava-o do bolso e fazia “Ding-dong”. Segundo Nat Hentoff, um de seus agentes lhe deixou porque não conseguia se comunicar com ele. “Eu falava com ele e tudo que ele respondia era “Bells” ou “Ding-dong”.
Uma outra lenda conta que Lester Young teria deixado a banda de Count Basie porque Basie teria marcado a gravação de um disco para uma sexta-feira 13.
Lester morreu em março de 1959, devido a problemas de saúde causados pelo abuso de bebidas alcoólicas.
Abaixo, vídeo de Benny Goodman e sua big band tocando Sing Sing Sing, com Gene Krupa na bateria e Harry James no trompete. O uso dos riffs fica claramente percebido desde o início com os naipes dos trombones e, em seguida, trompetes.